Numa
época em que tantos parecem ter tanta certeza sobre tudo, vale a pena pensar no
prestígio que a dúvida já teve. Nos diálogos de Platão, seu amigo Sócrates
pulveriza a certeza absoluta de seus contendores abalando-a por meio de sucessivas
perguntas, que os acabam convencendo da fragilidade de suas convicções. Séculos
mais tarde, o filósofo Descartes ponderou que o maior estímulo para se
instituir um método de conhecimento é considerar a presença desafiadora da
dúvida, como um primeiro passo.
Lendo os jornais e revistas de hoje,
assistindo na TV a entrevistas de personalidades, o que não falta são
especialistas infalíveis em todos os assuntos, na política, na ciência, na
economia, nas artes. Todos têm receitas imediatas e seguras para a solução de
todos os problemas. A hesitação, a dúvida, o tempo para reflexão são
interpretados como incompetência, passividade, absenteísmo. É como se a
velocidade tecnológica, que dá o ritmo aos nossos novos hábitos, também ditasse
a urgência de constituirmos nossas certezas.
A
dúvida corresponde ao nosso direito de suspender a verdade ilusória das
aparências e buscar a verdade funda daquilo que não aparece. Julgar um fato
pelo que dele diz um jornal, avaliar um problema pelo ângulo estrito dos que
nele estão envolvidos é submeter-se à força de valores já estabelecidos, que
deixamos de investigar. A dúvida supõe a necessidade que tem a consciência de
se afastar dos julgamentos já produzidos, permitindo-se, assim, o tempo
necessário para o exame mais detido da matéria a ser analisada. A dúvida pode
ser o primeiro passo para o caminho das afirmações que acabam sendo as mais
seguras, porque mais refletidas e devidamente questionadas.
- Cássio da Silveira
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- Diógenes de Sinope