terça-feira, 17 de novembro de 2020

A Voz



No Monte Calvário,  próximo da Confraria do Sorrisal, Boy Carioca espera o resultado da eleição com o ouvido coladinho no rádio. Enquanto espera, escuta o comercial da grife de roupa sub judice Nil Fashion: " Faça o dedinho em V e vista-se de mudança”.  Após a apuração final, Boy Carioca derrotado e triste, canta uma música de desabafo: “Dei cachaça, tira-gosto/ E dinheiro de montão/ E mesmo assim perdi a eleição/ Traidor, traidor/ Se tem coisa que não presta é um tal do eleitor...” (Moreira da Silva).
Dentro de uma plantação de girassóis ao sopé do Monte Calvário, junto à Cruz Vermelha, alguém balbucia: “JUIZ É O POVO”.  Virgulino, cabra da peste, com fogo nos olhos, libera seu bando para procurar quem por ventura tenha gritado, poderia ser um inimigo político. Zap! Zap!  Os facões amolados de Virgulino e seu bando saíram derrubando os girassóis por terra. Procura ali, mexe acolá, e nada. Enquanto isso, tucanos vindos de Campina Grande se fartavam das sementes, ao mesmo tempo que um velho mestre de obras passava ao largo sorrindo.
“ELE É TRABALHADOR! NADA ROUBO!” Eis que surge uma assombração encarcerada em forma de alminha e acima da Cruz Vermelha uma estrela resplandece no céu da praia de Cabo Branco. Prenúncio de mau agouro, uma onda azul repentinamente se forma, se agiganta, e inunda o Monte Calvário e tudo que estava ao seu redor.
Virgulino vendo tudo aquilo desiste da procura e sai ao encontro de “padin capitão”. O boy carioca procura seu protetor na Confraria do Sorrisal, se veste de azul e vai pagar suas promessas. E a voz miúda que vinha da plantação de girassóis: “O POVO É O JUIZ”, provavelmente se afogou ou voltou a ser uma estrelinha no céu, infelizmente, nada se sabe. Tem um dito popular que poderá responder: “Ladrão endinheirado não morre enforcado”; pois é, quem sabe morre afogado na onda azul do mar.
“Se a voz da noite responder/ Onde estou eu, onde está você/ Que estamos cá dentro de nós/ Sós. Se a voz da noite silenciar/ Raio de Sol vai me levar/ Raio de Sol vai lhe trazer/Onde estará o meu amor?...” (Chico César).

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"Não me tires o que não me podes dar!... Deixa-me ao meu sol."
- Diógenes de Sinope